“KEEPER OF DARKNESS” (“Tor dei gui mou yan”) Nick Cheung (2015) China


Este será mais um post em paralelo com o meu blog sobre cinema esquecido porque é inevitável visto estarmos a falar de um filme que irá passar ao lado de practicamente toda a gente.
É também o título perfeito para começarmos em grande este ano de 2017 aqui no blog.
Enquanto meio mundo há algum tempo atrás andava horrorizado a discutir quão mau era, ou iria ser o novo filme “Ghostbusters” eu descobria um dos filmes sobrenaturais mais surpreendentes dos últimos tempos, [“KEEPER OF DARKNESS”].

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E o que tem uma coisa a ver com a outra ? Bem…
Pessoalmente nunca hei de entender a fama de “Ghostbusters” e só encontro explicação para o sucesso por ter sido um dos filmes mais carregados de efeitos especiais a aparecer numa época em que os efeitos eram uma novidade nunca vista naqueles moldes e levavam muita gente ás salas só para verem raios e explosões animadas quanto baste pois os blockbusters modernos ainda estavam na sua infância e eram por isso uma novidade.
Nunca fui minimamente fascinado pelo franchise “Ghostbusters”, em 1984 não me disse grande coisa (mesmo tendo-o visto no cinema aos 14 anos) e para lá de achar o conceito muito original sempre detestei aqueles personagens.
O facto de hoje o filme tresandar ao pior dos anos 80 em termos de Hollywood ainda agravou mais o meu desprezo actual de todas as vezes que ao longo dos anos o tentei rever. Para mim “Ghostbusters” para mim sempre foi um franchising frustrante, pois sempre achei que haveria por ali algures uma boa história bem mais criativa para ser contada e há muito tempo que eu pensava que aquele conceito sobrenatural com fantasmas e caçadores de espíritos poderia ser algo divertido.
Por isso gostei agora tanto de [“KEEPER OF DARKNESS”]

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[“KEEPER OF DARKNESS”] é o “Ghostbusters” sério ( e a sério ) que eu sempre achei que deveria ter sido feito.
Não porque [“KEEPER OF DARKNESS”] envolva um grupo de “super-heróis” quotidianos que cacem fantasmas mas porque esta aventura Chinesa também é toda construída à volta da ideia de que partilhamos o nosso quotidiano com almas penadas; apenas não as conseguimos ver.
Nós não, mas algumas pessoas sim.
E [“KEEPER OF DARKNESS”] gira precisamente à volta de uma dessas pessoas; um tipo com capacidades –mediúnicas– que volta e meia vê-se envolvido em confrontos e exorcismos com todo o tipo de ectoplasmas chatos como o caraças que insistem em possuir ou assombrar o cidadão comum.

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Mas não pensem que o nosso herói aqui é uma espécie de versão masculina da personagem “Melinda Gordon” na série “Ghost Whisperers” empenhada em ajudar alminhas perdidas. Aqui o nosso exorcista de serviço – Fatt – tem conecções à máfia de rua de Hong-Kong, é amigo de um bando de vândalos mafiosos que percorrem as ruas “mafiando” ao mesmo tempo que tentam praticar algumas boas acções pelo caminho também; ( porque é bom para o Karma ) e vive com o fantasma de uma miúda que não quer partir “para o Outro-Lado” porque está apaixonada por ele e não quer ainda reencarnar.

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Tudo isto quando pelo meio de um par de exorcismos que correm de forma irregular Fatt detecta que apareceu nas ruas um novo espírito sedento de vingança e que pretende eliminar um por um todos os exorcistas das redondezas até chegar à pessoa responsável pela sua morte anos atrás num incêndio.
Para ajudar à festa, temos ainda o ajudante de Fatt, uma espécie de mafioso de quinta categoria em estilo-fashion-mete-nojo-hilariante mas que quer desesperadamente conseguir tornar-se também num exorcista e uma jornalista, que ao tentar desmascarar Fatt como impostor acaba por descobrir um mundo com que nunca sonhou e pelo meio apaixonar-se sem esperar. 
Mas há mais !

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Há mais, mas até já falei demais. Como sabem não gosto nada de contar as histórias dos filmes por aqui pois para mim um filme deverá ser visto sem saberem nada ou o mínimo sobre ele, mas desta vez precisava colocar a minha opinião dentro de um contexto concreto.
A verdade é que [“KEEPER OF DARKNESS”] tem mesmo um certo sabor a “Ghostbusters”, tanto nas cenas divertidas de exorcismo com os fantasmas, como na forma como usa a comédia com bom efeito até para fazer a narrativa avançar de um ponto a outro.

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Mas se [“KEEPER OF DARKNESS”] tem uma coisa absolutamente fascinante é o facto de conseguir equilibrar um monte de géneros dentro de uma só história e fazer tudo combinar sabe-se lá como !
Este filme numa questão de segundos consegue passar de uma comédia de efeitos especiais a drama pesado, consegue passar de cinema de aventura a cinema de terror ( com um par de bons arrepios pelo meio ), passa por um estilo blockbuster misturado com o cinema-de-Crime quando navega por ambientes com marginais mafiosos e ainda tem tempo para nos dar uma das melhores histórias de amor saídas do cinema chinês dos últimos anos.

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Aliás, se [“KEEPER OF DARKNESS”] funciona tão bem a todos os níveis e em todos os géneros que inclui no seu argumento desde o início é porque no seu coração está uma história de amor absolutamente divertida em modo fofinho oriental com dois protagonistas únicos.
Boas histórias de amor saídas do oriente normalmente partem do Japão ou da Coreia do Sul que tornaram o género quase numa forma de arte mas a China nunca conseguiu criar grande empatia quando tenta entrar por uma atmosfera de romance no seu cinema. 
Embora já tenha havido algumas excepções quando procuramos por cinema Chinês normalmente esperamos mais encontrar bons épicos históricos ou cinema de acção.

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Ora desta vez e tal como já aconteceu com “A TIME TO LOVE” ou “LOVE IN SPACE”, [“KEEPER OF DARKNESS”] acerta em cheio no coração emocional do filme. 
A história de amor entre Fatt e a fantasminha apaixonada que assombra o seu apartamento vai buscar o melhor do drama de “A time to Love” com a comédia contida mas romanticamente divertida de “Love in Space” e consegue momentos verdadeiramente atmosféricos que criam uma grande empatia com espectador e centralizam também todos os outros aspectos que compõem o filme.

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A fantasma pode ser fofinha mas ainda nos prega um susto valente ou dois bem colocados e o seu registo varia também entre a comédia e o drama algo angustiante por vezes numa questão de segundos, o que demonstra claramente que o realizador de [“KEEPER OF DARKNESS”] sabe muito bem o que está a fazer conseguido transportar o espectador ao longo da história numa verdadeira montanha russa de emoções inesperadas nos momentos mais inesperados também.

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[“KEEPER OF DARKNESS”] tem também um certo sabor ao cinema de Wong Kar Wai, o que só lhe fica bem neste caso. Não que a tentativa de homenagem a um certo estilo bem reconhecível seja por demais persistente mas nota-se aqui e ali a influencia do realizador de “In the Mood for Love” e isto sempre no melhor dos sentidos.
Quem gosta do cinema de Wong Kar Wai vai gostar deste filme por razões estéticas também. Aliás nem falta aqui Karina Lau, uma das actrizes recorrentes do cinema de Wai.
Se Wong Kar Wai um destes dias decidisse filmar algo bem mais comercial poderia inclusivamente criar a sequela para este filme pois o seu estilo iria enquadrar-se bastante bem.

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Acima de tudo estamos na presença de mais um filme com cenas espectaculares e montes de efeitos digitais que não se esquece do principal.
Os personagens e a humanização dos mesmos.
Se falha em alguma coisa será apenas no vilão pois a sua história ( e motivações ) no final acabam por parecer que não se integram tão bem quanto todo o resto do filme até ao desenlace final da aventura…

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Talvez por isso [“KEEPER OF DARKNESS”] seja um daqueles filmes com múltiplos finais, como se o realizador tivesse consciência de que parte de aventura nem sequer fosse o mais importante e resolvesse acabar a história do filme de uma forma mais humana.
A gente agradece.
 E o final “final” também é fixe.
Agora o que eu quero mesmo é uma sequela.

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CLASSIFICAÇÃO

Se procuram por cinema sobrenatural com almas penadas e um sabor a aventura urbana com um toque de terror, drama, comédia e uma excelente love story para rematar não vão mais longe.
 Ignorem as más reviews no IMDb pois como de costume foram postadas por americanos que se trocam todos quando não percebem de que género é um filme.
[“KEEPER OF DARKNESS”] é original, divertido, assustador, espectacular, dramático e tocante.
Tudo num único filme que resulta muito bem.

Cinco Tigelas de Noodles e um Gold Award


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Se calhar nem merece o Gold Award pois tem um par de falhas que lhe retira alguns pontos na história central envolvendo o vilão sobrenatural, mas a verdade é que este foi um dos filmes Chineses que mais me divertiu nos últimos anos.

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Comprei o Bluray na China ( região zero ) e acho que ainda gostei mais dele agora que o revi do que quando o vi pela primeira vez; pois da primeira vez a mistura de géneros pode deixar-nos um bocado aturdidos e impedir-nos de notarmos como [“KEEPER OF DARKNESS”] é realmente bom; por ser também algo único dentro do género.

A favor: a mistura entre géneros que funciona perfeitamente sabe-se lá como, o sentido de humor negro, a historia de amor, a química romantica dos protagonistas, as cenas assustadoras , a atmosfera sobrenatural, os personagens, a carga dramática , as cenas de acção, os efeitos especiais, mais uma vez a humanização dos personagens.

Contra: algum CGI podia ser melhor, a parte dramática ao redor do vilão parece algo deslocada do resto do filme e sente-se que está um bocadinho forçada para poder encaixar.

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NOTAS ADICIONAIS

TRAILER
Nota:
o filme não é o blockbuster de acção que aparenta no trailer. É bem mais contido e intimista contrariamente ao espectáculo de efeitos que o trailer aparenta mostrar.

IMDb
http://www.imdb.com/title/tt5157030/

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Hôrudo appu daun (Hold Up Down) Hiroyuki Tanaka (2005) Japão


Não fora a quantidade de piadas com Jesus Cristo presentes nesta divertida comédia japonesa e este [“Hold Up Down“] seria um sério candidato a remake americano.
Assim como está, dúvido que alguma vez vejam esta história em versão Hollywood pois o seu humor blasfemo teria certamente bastantes problemas com muito do público evangélico por terras do Uncle Sam com toda a certeza.

O que quer dizer que também não será própriamente um filme recomendado a pessoas mais religiosas ou que se ofendam facilmente com gags envolvendo o Jota Cê mais popular do planeta.
Quanto a mim contém algum do melhor humor blasfemo dos últimos tempos e só tenho pena que mesmo assim não seja tão ofensivo merecia ter sido, pois havia aqui material para ter sido ainda mais engraçado.

Na verdade apesar de conter algumas das melhores piadas com Jesus Cristo talvez desde “A Vida de Brian” dos Monty Python estas são na verdade até bem inofensivas para minha desilusão, pois muitos dos gags só teriam a ganhar se [“Hold Up Down“] tivesse tido coragem de ser menos politicamente correctos apesar de tudo, embora contenha gags hilariantes quanto baste envolvendo todas as situações inimagináveis com padres, psicopatas, policias malucos, ladrões azarados e Jesus deslizantes…

Este é um daqueles filmes que justifica plenamente a minha intenção original ao criar este blog para divulgar propostas cinematográficas originais daquelas que não se costumam encontrar nas salas com muita frequência; isto porque na verdade não se percebe bem que raio de filme é este.
Começa como sendo uma típica comédia de assaltos; uma espécie de – heist movie – em versão anárquica, estilo Pulp Fiction oriental em esteroídes algo contidos, mas logo entra por territórios completamente inesperados, tanto em estilo de argumento como em visual, o que levará a um par de bons momentos inesperados na segunda metade do filme quando entra por caminhos completamente parvos e totalmente inesperados.
O que torna [“Hold Up Down“] num daqueles titulos que nos agarra a partir do momento em que percebemos que na verdade não estamos a perceber o que raio estamos a ver e por isso precisamos mesmo de continuar a olhar para o ecran. Especialmente quando entra em cena o “Jesus Cristo” estilo picolé sobre rodas…

Mas [“Hold Up Down“] não vive apenas do humor blasfemo. Na verdade desde cedo se percebe que o seu estilo visual vai ser fundamental para que muitos dos gags tenham piada não pelo que se passa mas pela forma como muitas vezes os acontecimentos são filmados.
A sequência incial da esquadra de policia com todos os queixosos é um bom exemplo de como se pega em algo que no papel não passaria de um conjunto de personagens sem grande coisa para fazer e no entanto cria um momento de humor único envolvendo um turista perdido, um cidadão agredido, uma gaja boa vitima de assédio sexual, uma velhinha que perdeu um gato, um psicopata com um bastão e um “Jesus Cristo” assaltado frente a um par de policias totalmente ineptos.

Tudo numa sequência criativa que dura largos minutos em total plano fixo ao melhor estilo cinema-de-autor mas que aqui resulta num gag que essencialmente define o estilo visual que o filme irá tomar na forma como trata o humor da história.
[“Hold Up Down“] é por isso visualmente um filme muito estranho.
Para começar tem uma estrutura completamente imprevisível suportada por uma história daquelas que faz o espectador pensar a todo o instante que sabe o que vai acontecer , para de seguida lhe trocar as voltas  a todo o instante. É este um dos seus grandes trunfos para agarrar o espectador, isto porque se assim não fosse, o filme seria até demasiado estranho para poder ser considerado um comum filme comercial nos moldes a que estamos habituados devido á sua realização estilizada que nos lembra algo… a todo o instante…

Este é o tipo de filme que se tivesse sido produzido em Hollywood a máquina publicitária iria ter bastantes dificuldades em vendê-lo com um rótulo apontado a um target de audiências específico.
[“Hold Up Down“] tem um estilo visual e um ritmo tão estranho que não se enquadra própriamente no que estamos habituados a ver neste estilo de comédias totalmente anárquicas. Tem algumas semelhanças com “Men Suddenly in Black” mas se calhar consegue ir mais longe tanto nos momentos de humor como no próprio conceito.
Mas há mais.

Curiosamente o filme fazia-me lembrar aquele estilo “frio” do cinema de Stanley Kubrick mas em versão tresloucada a todo o instante. Até que percebi o porquê , o que me deixou bem surpreendido por não ter sido apenas impressão minha. E mais não posso dizer pois garanto-vos se conhecerem bem os filmes emblemáticos do realizador de Shinning vão curtir muito o que lhes vai aparecer pela frente na segunda metade da história pois se pensam que piadas com um Jesus Cristo seria o cúmulo da loucura nem imaginam o rumo que esta história toma a partir de certa altura com a sequência do casamento…

[“Hold Up Down“] é um daqueles titulos que valem mesmo a pena ser vistos pelo menos uma vez. Poderão não conseguir entrar fácilmente no seu estilo algo indefinido devido aos vários rumos que o argumento consegue tomar sem perder o fôlego e poderão até nem gostar do filme no final ou até achar-lhe grande piada. No entanto tenho a certeza que ficará na memória precisamente por ser tão diferente ao mesmo tempo que parece uma comédia de assalto típica.

Não procurem qualquer lógica na história. Não é para ter. É um daqueles filmes para curtir mesmo e não é para fazer sentido. Podia ser intitulado – “Mil e uma coisas para fazer com Jesus” – e vai agradar a toda a gente que tiver sentido de humor negro, gostar de filmes com policias, ladrões e … coisas do outro mundo em todos os sentidos.
Pode ser estípido como o raio, mas a ser alguma coisa poderá ser uma espécie de comédia dos Monty Python se alguma vez tivesse sido filmada pelo Stanley Kubrik e escrita pelo Quentin Tarantino, produzida no Japão.
Se estas referências lhes dizem alguma coisa não percam porque vale a pena.
Primeiro estranha-se, depois entranha-se.

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CLASSIFICAÇÃO:

Uma comédia cheia de momentos inesperados que muitas vezes até nem parece ter grande graça até que nos acerta com mais um gag totalmente inesperado para nos fazer rir á parva.
É um daqueles filmes para deixar o cérebro á porta e simplesmente curtir tudo o que de inesperado acontece nesta história que não tem ponta por onde se lhe pegue mas tem um grande sentido de humor negro de caríz biblico e até kung-fu sobrenatural. Além de ser uma história de policias e ladrões que também gostam de brincar com modelos de comboios e padres que de repente encontram Jesus na sua vida. E também mete um psicopata que ataca pessoas com bastões. E mais coisas inimagináveis…
Um filme bastante original que na verdade nem se consegue enquadrar em qualquer género, pois por vezes até parece cinema-de-autor para logo no momento a seguir se calhar até não.
Divertido quanto baste, inofensivo, braindead e muito criativo na forma como mistura géneros diferentes para um resultado que merece na boa cinco tigelas de noodles e só não leva um Gold Award também porque nem sei…

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A favor: a originalidade da estrutura da história, as piadas com “Jesus”, o inesperado de muitos gags, a realização que alterna entre o Kubrick pastilhado e o Tarantino na ganza, tem um argumento totalmente imprevisível, personagens alucinantes e completamente ilógicos, mistura uma quantidade de géneros num argumento que não tem ponta por onde se lhe pegue e faz tudo resultar num produto bem divertido.
Contra: na verdade não tem nada de negativo…poderá ser demasiado estranho para quem está habituado a um tipo de comédia mais comercial ao estilo ocidental, as piadas religiosas poderiam ter sido muito mais ácidas pois quanto a mim ficaram ainda demasiado politicamente correctas para o que eu gostaria que tivessem sido, a cena de acção com kung-fu parece demasiado longa, é original mas provavelmente não ficará na memória.

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NOTAS ADICIONAIS

Trailer
NOTA: Não vejam o trailer antes de verem o filme pois vai quebrar muitas das surpresas visuais que fazem grande parte das piadas resultar pelo seu inesperado quando se vê o filme sem sabermos nada dele.
http://www.youtube.com/watch?v=h4tTAvgcGhs

Comprar
http://www.cdjapan.co.jp/detailview.html?KEY=JABM-8003

Download aqui.

IMDB
http://www.imdb.com/title/tt0461523

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Gui si (Silk) Chao-Bin Su (2006) Japão


De vez em quando surgem uns filmes que tentam ir para além de um único género e procuram apresentar propostas com alguma originalidade mas a coisa nem sempre resulta particularmente bem.
Este [“Silk“] é no entanto um bom exemplo desse tipo de filmes que quase conseguem criar algo realmente especial.

Já muito se tentou fazer cruzando vários géneros de cinema e neste caso estamos perante uma história híbrida bastante curiosa que tenta apresentar um conceito novo algures entre a ficção-científica e o típico filme de terror oriental.
[“Silk“] é uma boa tentativa, parte de uma ideia que eu ainda não tinha visto em cinema e quase que posso apostar que um destes dias vamos ainda ver um qualquer remake americano disto. Pelo menos, no que toca ao conceito base da história, [“Silk“] está mesmo a pedir que Hollywood vá lá buscar inspiração.

A ideia aqui tem a ver com um grupo de cientístas que conseguiram capturar o fantasma de uma criança e o têm prisioneiro no quarto de um discreto apartamento assombrado por esta alma penada.
O apartamento está transformado num laboratório secreto e a ideia será não só tentar descobrir o que é afinal um fantasma, mas também quem é a alma da criança e porque razão ainda se econtra entre este mundo e o próximo sem ter partido quando morreu.

Acontece, que este ectoplasma emite um residuo que poderá revolucionar toda a ciência á volta do estudo da anti-gravidade e como tal, temos também um cientísta meio louco que não olha a meios para chegar á sua descoberta, mesmo que para isso se aproveite do sofrimento do fantasma infantil.
Adicionando a tudo isto, um polícia que se vê envolvido no mistério no seguimento de uma investigação de homícidio obtemos um estranho cruzamento entre vários géneros de histórias.

[“Silk“] começa como filme de terror, continua como thriller policial, passa ficção-científica high-tech com um toque de máfia e intriga política pelo meio, entra pelo filme sobrenatural, segue para o drama clínico (a mãe do polícia está a morrer no hospital), tem um cheirinho de cinema de acção e termina com um toque de cinema romântico oriental (o polícia tem uma namorada fofinha) misturado com uma resolução positiva do mistério da origem da criança fantasma num tom de feel-good-movie num final a condizer tudo isto.

E isto resulta ?
Bem…resulta. Agora podia ter resultado melhor.
Na verdade não há nada de errado com [“Silk“], a história é intrigante, o filme tem uma montagem porreira que consegue ir alternando os vários tipos de ideias num único novelo coerente e tem realmente qualquer coisa de originalmente apelativo.
O seu único problema é que no meio de tanta ideia e referência bem executada, acaba por não deslumbrar em nenhuma delas nem dar nada ao espectador que o entusiasme particularmente ao longo de todo o desenrolar do filme.

As cenas de terror são atmosféricas, chegam a causar um par de boas surpresas e arrepios na espinha quanto baste mas por causa de tanta fragmentação de estilos ao longo da história o ambiente nunca se mantém de forma a nos inquietar constantemente. Os conceitos de ficção-científica são muito interessantes mesmo, as ideias á volta da teoria da anti-gravidade são muito interessantes e os efeitos digitais á volta do conceito do cubo high-tech dão uma atmosfera curiosa á história que nos mantém o interesse também á volta desta parte mais sci-fi. O problema é que mais uma vez sente-se que havia aqui algo que poderia ter sido bem mais interessante e não foi.

No que toca á parte policial, ou ás sequências em estilo de thriller de acção a coisa também segue pelo mesmo estilo.
[“Silk“] contém um par de boas cenas de suspanse e acção mas depois acabamos por sentir falta de mais, porque o filme não tem tempo para se focar demasiado tempo em cada um dos seus estilos e como tal dispersa-se um bocadinho por todos os géneros.

O que prejudica naturalmente também o lado mais emotivo da história. A carga dramática em tom pesado hospitalar no que toca á história do policia e da sua mãe moribunda por vezes parece excessiva e desnecessária e a história de amor parece-nos um bocado á deriva sem muito para contribuir para o conceito principal de [“Silk“].
Embora, a parte romântica  mesmo sendo breve consiga interessar-nos e até dar alguma frescura á história, isto porque o personagem do polícia consegue cativar-nos ao longo da narrativa e por isso damos por nós a torcer para que a sua história tenha um final feliz.

Uma das coisas que quanto a mim estraga um bocado o conjunto e dá uma ideia mais fraca de [“Silk“] enquanto filme, é o personagem do cientísta vilão, pois a sua caracterização é algo absurda e desprovida de motivação coerente o que contrasta um bocado com todo o cuidado que foi colocado para que a história resulte bem como um todo.
Este personagem parece ter saído de um mau Anime televisivo. Além de ter um look todo estiloso e passar todo o filme em pose constante para a câmera, todas as suas motivações parecem mais saídas de um desenho animado infanto-juvenil do que propriamente de um personagem coerente com toda a tentativa de seriedade que percorre [“Silk“] e isto é talvez o pior contraste de todo o filme.

Se [“Silk“] tivesse tido um vilão menos estéreotipado e mais até dentro daquele tipo de história séria de sci-fi que pretende contar, se calhar teria resultado melhor em termos de suspanse. Isto porque qualquer ambiente credível da história é logo imediatamente quebrado quando muita da atenção do espectador vai para as poses estilosas do vilão quando este está em cena em vez de nos focarmos na narrativa como seria de esperar se este personagem estivesse melhor integrado no estilo sério do argumento.

De qualquer forma, [“Silk“] é um filme a ver sem reservas.

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CLASSIFICAÇÃO:

Quem procura uma mistura entre terror oriental e ficção-científica high-tech tem aqui uma proposta muito interessante.
É um bom filme de vários géneros e consegue manter tudo ligado sem parecer particularmente forçado, embora não nos deslumbre em nenhum deles e é pena.
De qualquer forma, trés tigelas de noodles porque é um bom thriller. Nem mais, nem menos. Espreitem porque vale a pena, quanto mais não seja porque tenta ser original e de certa forma até o consegue.
Podem apostar que um dia destes aparece por aí o remake americano pois [“Silk“] está mesmo a pedi-las…

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A favor: as partes sobrenaturais conseguem provocar um arrepio ou dois, mete um fantasma criancinha e portanto o factor creepy é garantido, a ideia do fantasma capturado é muito boa, o conceito de ficção-científica é interessante, as poucas sequências em tom de thriller policial de acção complementam bem toda a história, o mistério á volta da criança alma penada é previsível mas mesmo assim mantém-nos interessados no seu desenvolvimento, a mini-parte romântica não deslumbra mas resulta bem e dá personalidade ao resto da história porque contrasta bem com o tom dramático de tudo o resto, o filme tem ideias a mais que poderiam ter dado filmes individuais de vários géneros diferentes mas consegue equilibrar tudo sem parecer forçado e portanto é uma boa tentativa de se criar algo diferente.
Contra: por ter ideias a mais não consegue dedicar demasiado tempo a cada uma delas e por isso apesar de [“Silk“] resultar de forma competente e agradável de seguir nunca nos deslumbra nem ficará particularmente na memória, é um daqueles filmes que se vê uma ou duas vezes e depois metemos na prateleira até um dia, o vilão em estilo Anime piroso interfere demasiado no tom sério da história e além disso é um personagem completamente de cartão o que fragmenta ainda mais um produto que não precisava de mais distrações para competir com a atenção do espectador, o mistério á volta da morte da criança é por demais previsivel e já vimos isto antes mil vezes.

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NOTAS ADICIONAIS

Trailer
http://www.youtube.com/watch?v=wZZYeUrCbkY

Comprar
http://www.play-asia.com/paOS-13-71-7m-49-en-70-1t7t.html

Download aqui

IMDB
http://www.imdb.com/title/tt0486480/combined
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Sigaw (The Echo) Yam Laranas (2004/2008) Tailândia/Usa


Esta recomendação vai ser feita de uma forma diferente do habitual, e será uma espécie de dois-em-um, até porque a forma como cheguei até [“Sigaw“] seguiu o caminho inverso do que é habitual.

Há um par de meses atrás vi um filme de terror americano recente que me ficou na memória, tanto pelo excelente estilo visual como pela história atmosférica bem contada e perturbante.
Chamava-se “The Echo” e chamou-me a atenção pelo sentido estético dos enquadramentos, pois na habitual enxurrada daquilo que hoje passa por cinema de terror saído dos estados unidos não tem sido muito comum aparecerem produtos dentro do género que não pareçam mais do telefilmes.
Acontece que “The Echo” logo desde o início contrariava essa forma de filmar e na verdade até pensei que o filme deveria ter sido um fracasso pois nem a sua montagem se enquadrava dentro do estilo videoclip MTV habitual em Hollywood nem tinha própriamente teenagers com psicopatas mas contava uma boa e velha história de fantasmas.

Tudo em “The Echo” contraria um pouco aquilo que tem sido o cinema de terror para o grande público (americanizado) e inclusivamente a sua atmosfera algo melancólica (doentia até) resultou numa obra com um tom muito triste que não é de forma nenhuma recomendável para quem procura apenas divertir-se com um normal filme pipoca.
De qualquer forma, eu gostei mesmo muito de “The Echo”, pois acima de tudo está cheio de bons momentos de tensão e sequências arrepiantes quanto baste.
O conceito, embora não tenha sido particularmente original usou muito bem os clichés mais clássicos das típicas histórias de fantasmas e quando o filme acabou eu estava não só arrepiado (deprimido até), mas convencido que o realizador tinha criado um filme relativamente único dentro das produções modernas americanas e que seria dificil alguém ter feito melhor do isto com esta história.
Até que descobri uma coisa…

E não é que esta produção americana era na verdade outro remake de mais um filme oriental ?!!
“The Echo” é nem mais nem menos do que a versão para ocidentais consumirem de um filme Tailandes chamado [“Sigaw“] produzido no outro lado do mundo quatro anos antes.
Mas há mais !
E não é que o realizador do remake americano é o mesmo realizador do filme original ?!
Hollywood mais uma vez, foi beber á fonte e contratou o autor original para refazer a sua própria obra de modo a agradar ao público ocidental. Tal como já tinha acontecido com o remake do “Ju-On”.
Neste caso, como nunca ouvi falar alguma vez deste “The Echo”, e pelo próprio estilo algo intimísta (e deprimente) do próprio remake, aposto que o tiro saiu pela culatra aos produtores americanos e muito provavelmente o remake deve ter fracassado brutalmente nas salas e ido directamente para dvd.

Nunca irei entender esta moda dos americanos refazerem filmes que já são extraordinariamente bons no seu país de origem só porque o público gringo não sabe ler legendas. Normalmente a coisa dá para o torto e quando não dá, como aconteceu com “The Echo” o resultado ganha contornos quase de cinema de autor e é inevitável que o remake falhe totalmente nas bilheteiras ocidentais que esperam sempre mais do mesmo e não conseguem mais prestar atenção a um filme feito essencialmente por planos fixos e sem montagem de quinhentos frames por segundo ou cenas de acção a bombar de x em x tempo.
Eu gostei muito de “The Echo” e em termos visuais , penso que é bem superior ao original [“Sigaw“], até porque os meios de produção foram outros, nomeadamente no que toca á fotografia que é fantástica no remake; no entanto, quando eu pensava que “The Echo” já era suficientemente perturbante ao ver o original nada me preparava para o que me ia cair em cima.

Depois de vermos uma versão de qualquer história, é muito raro que o original cause o mesmo impacto, pois afinal o efeito surpresa do argumento já se perdeu e practicamente não há muito mais que nos possa assustar mesmo tratando-se de um filme de terror.
Isto pensava eu !
Comecei a ver [“Sigaw“] na maior descontração sem lhe prestar grande atenção, (até porque depois das fantásticas imagens cuidadas do remake, a qualidade visual do original parecia muito pobre em comparação).
No entanto, o filme começa logo com um plano realmente assustador. A primeira imagem do prédio onde toda a história se passa nesta versão original, bem que pode entrar directamente para uma galeria das mais emblemáticas sobre casas assombradas do Cinema.
Logo por aí comecei  a ter um vislumbre de que se calhar o filminho até nem iria ser tão levezinho quanto eu pensava mas nada me preparava para o que viria a seguir.

[“Sigaw“] é assustador como o raio !
“The Echo”, mete medo, mas é aquele medo á americana. Ou seja, está tudo tão bem filmado, todas as imagens são tão bem cuidadas que o espectador acaba por estar a ver a história numa posição de terceira pessoa, isto é, sem se deixar realmente envolver pelo que se passa no ecran. E depois a atmosfera triste, melancólica e deprimente também ajuda a suavizar um bocado a história principal. Isto porque “The Echo” conta ainda com um novo sub-plot completamente desnecessário que não existe em [“Sigaw“] e que distrai demasiado as atenções do horror principal que o filme original tão sabe orquestrar.

[“Sigaw“] é assustador como o raio, mas não é por ser própriamente por ser uma história de fantasmas. Não há nada neste filme que vocês não tenham visto já dezenas de vezes neste género de cinema e inclusivamente para um filme que não é americano, o realizador usa e abusa dos típicos sustos estilo Hollywood com SOM ALTO REPENTINO  nos locais mais esperados o que poderia ter sido uma péssima opção.
[“Sigaw“] é assustador como o raio, porque não depende desses truques para meter medo, mas porque o medo é gerado pela própria atmosfera da história. Se calhar mais do que medo, será apropriado dizermos que [“Sigaw”] é uma história perturbante e é isso que a faz resultar enquanto filme de terror. Isto até poderia ser um filme sem qualquer cena sobrenatural que garanto-vos ia dar-lhes cabo dos nervos na mesma !

Essencialmente [“Sigaw“] é uma história sobre violência doméstica.
Mas uma história sobre violência doméstica, com uma intensidade que os fará ficar sem respiração em alguns momentos, pois tem sequências absolutamente terríficas que nem se comparam ao que acontece depois na versão bem mais politicamente correcta filmada para o remake americano onde tudo é bem mais encenado, plástico e cinematográfico ao contrário da crueza que existe no original e que os fará não conseguir tirar os olhos do ecrã a partir de certa altura mesmo se já viram o remake antes.

Básicamente o filme conta a história de um rapaz que vai viver para um apartamento onde tem por vizinhança um polícia violento que maltrata a sua mulher e filha ao mesmo tempo que se sente uma presença sobrenatural em todo o ambiente do andar onde vivem. No mesmo piso vive também outra pessoa que conhece bem os maus tratos a que a mulher do polícia está sujeita mas que pouco fez ou continua a fazer para tentar impedir que a situação continue.
Temos ainda, um senhorio, a namorada do heroi e a criancinha filha da rapariga maltratada. Tudo gira á volta do medo que toda a gente tem do polícia violento e de como as pessoas se podem unir para interferir neste tipo de situações. Além disso, o filme mete criancinha e  todos nós sabemos que quando um filme de terror mete criancinhas a coisa só tem que ficar ainda melhor e como se as cenas de violência doméstica não fossem desde logo brutalmente intensas pelo suspanse que provocam o realizador ainda resolve pregar-nos um par de arrepios com corredores ás escuras e menininhas na penumbra. Brrrrrr !

Portanto, eu adorei [“Sigaw“] e quanto a mim é um daqueles títulos que pode muito bem figurar entre os melhores filmes de casa assombrada de todos os tempos. O remake “The Echo” é muito bom, mas não se compara aos nervos que este filme original consegue provocar até mesmo em quem já conhece a história e é um daqueles raros filmes de terror que consegue sempre voltar a assustar mesmo quando revisto várias vezes, embora não fiquemos com muita vontade de o estar sempre a rever apesar das suas qualidades indiscutíveis.

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CLASSIFICAÇÃO:
Apesar de ser um filme de terror absolutamente eficaz, ainda pensei atribuir-lhe menos meia tigela de noodles, isto porque enquanto objecto visual, não é um titulo que fique na memória pelas suas imagens, enquadramentos ou sequências sequer, (ao contrário do que aconteceu depois no remake que se destaca pela sua estética cuidada), no entanto não há dúvida que [“Sigaw“] é um dos melhores filmes de terror que poderão ver se estiverem á procura de uma história de fantasmas ao melhor estilo clássico.
Por isso, cinco tigelas de noodles porque esta coisa, mais do que assustadora, é um filme perturbante e com suspanse quanto baste.

A favor: é uma história de fantasmas clássica, é assustador, é perturbante e não precisa de mais nada para ser excelente. É melhor que o remake, embora este também seja muito interessante mesmo e também se recomenda.
Contra: a história é por demais previsivel mas não é grave, nota-se que é um filme de baixo orçamento, a fotografia dificulta a apreciação de algumas cenas, usa e abusa dos sustos com som alto embora curiosamente isso nem estrague o resultado final pois a atmosfera da história é mais assustadora do que qualquer susto desse estilo.
Se este original já é tão bom, para quê um remake ?
A fraca nota no IMDB de ambos os filmes é um triste exemplo do plástico a que o público ocidental está habituado.

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NOTAS ADICIONAIS:

Trailer SIGAW
http://www.youtube.com/watch?v=spnUXeKwnMA

Trailer The Echo
http://www.youtube.com/watch?v=lPtwWaIOqEs



Comprar

Se descobrirem onde comprar o original, digam-me qualquer coisa. Podem no entanto ir buscá-lo em download aqui.
O remake americano podem comprar aqui e aqui.

IMDB – SIGAW
http://www.imdb.com/title/tt0423195/combined
IMDB – The Echo
http://www.imdb.com/title/tt0897347/combined

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Filmes semelhantes de que poderá gostar:

A Tale of Two Sisters Dark Water

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Bu san (Goodbye Dragon Inn) Ming-liang Tsai (2003) China/Taiwan


A minha primeira reacção a [“Goodbye Dragon Inn“] foi a pior possível e já me preparava para vir para aqui dizer o quanto tinha detestado este típico exemplo de cinema-de-autor no pior dos sentidos, pois há muito que não via um filme tão enervantemente secante !
Este é daqueles que a uma primeira visão pode criar um verdadeiro teste á nossa força de vontade para não carregarmos no botão de fast-forward dezenas de vezes.

Até eu que tenho “Solaris” (versão Tarkovsky), como um dos meus filmes favoritos, ao ver [“Goodbye Dragon Inn“] pela primeira vez só pude dizer: –“MAS CA GRANDA SECA DO #$#”%& !”
O “Solaris” soviético original comparado com isto é um filme do Michael Bay.
E não, não tentem imaginar, pois sem verem [“Goodbye Dragon Inn“] vocês não irão mesmo conseguir conceber a lentidão desta obra que não fica nada a dever ao mais clássico filme do Manoel de Oliveira, talvez com a diferença de que os do realizador Português têm uma montagem muito rápida em comparação…

Isto porque [“Goodbye Dragon Inn“] é o típico filme com que toda a gente goza !
(Pessoal do Brasil podem parar de rir, porque isto quer dizer outra coisa em Portugal e este não é um filme desses…) 😉
[“Goodbye Dragon Inn“] é um daqueles filmes em que básicamente se aponta uma câmara para o chão e depois filma-se em tempo real a erva a crescer, por isso estão avisados.
E a história também é semelhante. Pelo menos á primeira vista.
[“Goodbye Dragon Inn“] é lento. MUITO LENTO ! Diria, até PARADO !
Basta dizer que tem uma sequência (genial?), em que se vê apenas um plano único que dura 4 minutos (sim, QUATRO MINUTOS) com uma sala vazia, por isso meus amigos, quem acha o “2001 Odisseia no Espaço” chato e vazio, nem imagina o que o espera aqui e só pela experiência vale a pena espreitarem.

Essencialmente, o filme é constituído por planos únicos e longos. Muito, muito, muito, muito, muito looooooooooongos (numa atmosfera algo deprimente, fria ou até doentia) e o primeiro diálogo entre personagens ocorre aos 40 minutos de um filme que só tem 80, por isso já estão a ver ideia.
Por isso, [“Goodbye Dragon Inn“] é um daqueles filmes de que é fácil não gostar.

No entanto…
O problema, é que ao vê-lo pela primeira vez, mesmo após ter-me arrastado ao longo dos seus penosos 80 minutos de duração, o raio do filme ficou-me na memória durante o dia todo e por mais que me preparasse para vir para aqui desancar este título, a verdade é que [“Goodbye Dragon Inn“] não se tinha tornado  tão simples de detestar quanto a frustração inicial que me causou. Só havia uma coisa a fazer.
Voltar a vê-lo.

E não é que a uma segunda visão, as coisas começam a tornar-se mais fascinantes ?
É que ao contrário do que é costume, apesar de ser lento, (ok,ok… chato), na verdade não tem aquela carga pretenciosa carregada de génio égocentrico que muitos filmes de autor costumam exalar de uma forma insuportável quando um realizador com pretenções a Artista plástico está mais interessado em fazer maravilhosas instalações artísticas videográficas cheias de metáforas e intervenção sociológica do que filmar uma história.

[“Goodbye Dragon Inn“] é um filme secante como há muito não me passava pela frente.
Por causa disso é um daqueles titulos que corre logo á partida o risco de alienar metade da audiência pois a sua estrutura faz com que o espectador casual passe ao lado um filme único sem lhe dar mais qualquer hipótese por este sair do tipo de cinema mais fácil de digerir.
Muita gente não aguentará vinte minutos disto sequer, mas quem conseguir vê-lo até ao fim, muito provavelmente ficará com muita da sua atmosfera assombrada no pensamento durante horas a seguir.

Quem ganhar coragem para o voltar a ver, então se calhar é porque também foi apanhado por aquilo que de certa forma torna esta obra especial e a sua falta de prentenciosismo para se armar em “inteligente” é uma mais valia, ao contrário do que costuma acontecer em muito cinema de autor supostamente Iluminado logo á partida.
Pode ser uma opinião pessoal, mas a ideia com que fiquei disto é que o realizador filmou assim porque simplesmente faz parte do seu estilo visual e nada mais e por isso se partirem para [“Goodbye Dragon Inn“] uma segunda vez e conseguirem acompanhá-lo  já conhecendo a forma como ele está apresentado, não estranhem se de repente começarem a ver esta história com outros olhos.

Se alguma vez tiveram na vossa cidade uma sala de cinema de que gostaram muito e que talvez tenha feito parte da vossa infância ou juventude mas que agora já não passa de uma relíquia do passado tendo sido substituída pelos plásticos cineplexes dos shoppings, se calhar encontrará em [“Goodbye Dragon Inn“] alguma magia e irão identificar-se com a sua nostálgica tristeza, pois apesar de “não ter história nenhuma” é um filme sobre a magia do Cinema e se calhar de como este era bem melhor (e bem mais mágico) quando o viamos, não com som DTS em cadeiras almofadadas e em salas de ar condicionado mas em cinemas antigos com som mono, ecrans de pano rasgados,  fitas queimadas e moscas quanto baste; em sessões onde ainda as pessoas viam os filmes caladas, era proíbido comer nas salas e estavamos numa altura em que não estreava um blockbuster todas as semanas que já estará esquecido na semana seguinte.

É esse o tema subliminar de [“Goodbye Dragon Inn“], apenas não usa uma história para falar desses tempos mas sim mostra os ambientes actualmente solitários que outrora tiveram dias de glória.
É chato ? É pois.
É uma seca do camandro ? Pois é.
Mas resulta ?
Resulta pois !

Não se deixem enganar com as comparações deste filme com o “Cinema Paradiso“. É certo que a sua alma é a mesma, mas a sua forma não tem nada de idêntico por isso não esperem o mesmo tipo de filme. No final a sua magia é a mesma, mas [“Goodbye Dragon Inn“] exige uma predesposição para o aturar que não era necessária no poético filme de Tornatore. No entanto ambos os filmes acabam por ir dar ao mesmo e ambos recordam uma época que já não volta mais no que toca á velha relação do público com a magia do Cinema e só por isso também vale a pena tentarem espreitar esta produção made-in-Taiwan.
No entanto façam-no por vossa conta e risco. 😉

Mas afinal o que fazem os personagens neste filme ?
Não se preocupem com *spoilers* pois em [“Goodbye Dragon Inn“] isto não se poderá aplicar de todo e até poderá ajudar á navegação do pessoal que não está muito habituado a espreitar este género de cinema.
Resumindo:
Essencialmente acompanhamos várias histórias que representam as várias fases de glória de um velho cinema clássico através da presença e do olhar de quatro ou cinco personagens. A maioria nem sequer abre a boca durante o filme todo mas cada um conta um pouco da história do Cinema em geral.
Estamos na última noite antes de um velho cinema ir fechar para sempre e pela última vez, passam na última sessão um dos clássicos do cinema de artes marciais chinés, chamado precisamente “Dragon Inn“.

Outrora algo que enchia a velha sala com espectadores com o passar das décadas e o aparecimento dos novos cinemas modernos a situação inverteu-se e no momento presente em que [“Goodbye Dragon Inn“] decorre o filme Dragon Inn, atrai apenas almas solitárias que parecem tão deslocadas do ambiente da sala quanto a sala está isolada no tempo. Incapazes de comunicar uns com os outros, a única coisa que têm em comum é o facto de todos estarem presentes nesta última sessão e essencialmente o filme “filma” a sua presença nesse ambiente e nesse momento como se fosse o registo final de uma Era que apenas tem o tempo de vida da duração da última projecção de Dragon Inn.

Acompanhamos a empregada do cinema que deambula como um fantasma do passado pelos corredores do edifício com a sua deficiência física – (uma sombra da beleza que também ela teve um dia?) – tentando discretamente captar a atenção (romântica?) do projecionista como se fosse uma última tentativa para se fazer notar.
E enquanto o filme decorre na sala principal, observamos um turista homosexual japonês solitário que procura algo mais do que cinema, assistimos ao seu encontro incómodo com outro homem num corredor onde nada se passa mas onde se menciona que o edificio poderá estar cheio de fantasmas.
Simbólicos ou literais ?

Observamos ainda duas velhas estrelas do filme Dragon Inn original (os verdadeiros actores) que agora já idosos assistem á sua juventude perdida no ecran daquele cinema vazio mas em locais separados sem nunca notarem a presença um do outro. Essencialmente , estes e mais um par de outros personagens formam um padrão de figurantes que compõem toda a essência de [“Goodbye Dragon Inn“] e transportam o filme até ao seu final em que se mostra apenas a sala vazia, – (seriam alguns desses espectadores na verdade fantasmas ?)

A empregada e o projeccionista abandonam pela última vez a velha sala de cinema sem se cruzarem (seriam reais?) ao mesmo tempo que deixam para trás um passado que já não voltará e talvez também uma possível relação romântica que já não terá oportunidade de florescer, ao mesmo tempo que toda a emotividade do momento é resumida numa canção tradicional chinesa sobre a saudade e nostálgia.
The End
.

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CLASSIFICAÇÃO:
Hesitei entre dar-lhe apenas trés tigelas de noodles ou quatro, apenas porque é realmente um filme díficil…ok, chato !
No entanto decidi-me pelas quatro tigelas de noodles porque realmente há aqui qualquer coisa de especial e se entrarmos na onda enquanto espectadores quanto mais detalhes descobrimos naqueles planos únicos de 4 minutos, menos secante o filme nos parece.
Por isso e para prevenir logo isto, por agora fica com quatro tigelas embora algo me diga que um dia destes ainda lhe aumento a classificação.
No entanto isto não quer dizer que eu recomende [“Goodbye Dragon Inn“] a toda a gente e muito menos a quem chega agora á procura de cinema oriental “normal”, pois provavelmente se vir isto assim sem qualquer aviso prévio  se calhar não quererá ver mais nada depois.
De qualquer forma, é um filme que merece uma oportunidade.
Se estiverem habituados a cinema de autor provavelmente irão adorar, se não estiverem e quiserem começar por uma coisa mais levezinha dentro do género sempre podem começar pelo “In the Mood For Love” , pelo “Days of Being Wild” ou “2046” antes de experimentarem [“Goodbye Dragon Inn“]. 

Mas não deixem um dia destes de lhe dar uma chance.
É o antídoto perfeito para uma dose dupla do “Transformers” do Michael Bay. Vão por mim.
E sim, [“Goodbye Dragon Inn“], é uma seca descomunal, mas vale quatro tigelas de noodles na boa.
Se é que não vale até mais…

A favor: para além da seca inicial que pode provocar a uma primeira visão tem uma profundidade que na realidade nem precisa de diálogos para nada, a atmosfera assombrada, tem alma e evoca nostálgia, só tem 80 minutos, tem um bom estilo visual, não é um filme pretencioso e apesar de ser “art-house” tem uma identidade modesta e genuína sem pretenções, quanto mais se revê menos secante parece e mais fascinante se torna, será uma história sobrenatural ?
Contra: quem nunca viu cinema de autor é melhor não começar por este, planos fixos de 4 minutos com salas vazias é capaz de ser demais para muita gente, idem para muitas outras sequências de plano fixo ao longo do filme, a atmosfera assombrada ás vezes pode ser algo doentia a fazer lembrar um filme de terror, é uma seca do caraças se não estiverem com predisposição para o que irão encontrar pela frente.

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NOTAS ADICIONAIS:

Trailer
http://www.youtube.com/watch?v=zHMxMJ6qkOU



Comprar

Só o apanharão em Sellers da Amazon americana

Ou Podem ir buscá-lo aqui.

IMDB
Goodbye Dragon Inn

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